01 setembro 2007

Francis Ao Vivo - os ao vivo pela primeira vez completam CD e DVD essencialmente musicais, dia 8 no MPAC

“É tudo que eu queria: essa canção/ Movida a dor, a sonho, a morte, a vida/ Essa paixão ainda ávida de tudo/ Da lua, da chegada e da partida...”. Ao se iniciar a audição de Ao Vivo tem-se a impressão, logo nas duas primeiras faixas, de um Francis Hime reflexivo. Segundo o dicionário, reflexivo é aquele que reflexiona, que por conseguinte é o ato de ponderar, fazer reflexões. Conforme o show avança, e aparecem canções que fazem parte da trilha sonora das vidas de muitos que ali estão (e grande parte até então nem se dava conta da autoria delas), as impressões se misturam às reações: vem a surpresa, a identificação...Aqueles acordes são muito familiares, próximos e ,assim,a simbiose se estabelece. Os versos metalingüísticos de Geraldo Carneiro para Mais que Imperfeito coadunam o caráter essencial deste projeto: uma obra, um artista e seu público.

Em suma, Francis ao Vivo é o registro realizado no Sesc Pompéia, em São Paulo, do show que o maestro vem apresentando desde o ano passado, uma fusão de seus dois trabalhos recentes, Álbum Musical (2004) e Arquitetura da Flor (2006): Álbum é uma reedição das canções de carreira na voz de artistas fundamentais na obra de Francis (gravado originalmente em 95); já o segundo, o último e despojado disco de inéditas. Predominam, neste ao vivo, os grandes sucessos do primeiro, músicas definitivas do cancioneiro nas últimas quatro décadas:

- “A beleza da obra de Hime perdura desde que a primeira música foi composta em 1963. Ele compôs bastante, algo em torno de 400 músicas, mas gravou pouquíssimo. Francis Hime nos deixa a leve impressão de que nunca é tarde”, filosofa Arthur Dapieve.

Sendo assim, o ouvinte pode se deparar com novos "figurinos" aplicados a pérolas como Pivete, A Noiva da Cidade, Embarcação, Trocando em Miúdos, Amor Barato, Atrás da Porta, E Se e Quadrilha (da parceria com Chico Buarque); A Dor a Mais e Tereza Sabe Sambar (com o parceiro primordial, Vinicius de Moraes); e Desacalanto (com Olívia Hime). Estes novos “figurinos” têm a ver com a estética adotada por Francis após o disco Brasil, Lua Cheia, de 2003: “Passei a explorar uma sonoridade mais enxuta, em contraponto à grandiosidade orquestral que caracteriza a maioria dos meus trabalhos até então. Procurei valorizar melodia e harmonia, dando um tratamento despojado às canções”.

A banda formada por Kiko Freiras (bateria), Jorge Helder (baixo) e Gabriel Improta (violão e guitarra), além, é claro, do inconfundível piano de Francis, levam a cabo a musicalidade enxuta (e sofisticada) adotada pelo maestro. E seguem, executando as singularidades estéticas de músicas mais recentes como Sem Saudades (com Cartola), A Invenção da Rosa, Gozos da Alma e a Musa da Tv- esta só no dvd- (compostas com Geraldo Carneiro) e Palavras Cruzadas (com Toquinho). Completam o repertório Pau Brasil (outra da profícua parceria com o esteta Geraldo Carneiro) e Cadê (com Simone Guimarães).

Francis Ao Vivo flagra o ápice da relação que pode ser estabelecida entre um criador e sua obra; leia-se relação como respeito pela própria trajetória, numa época em que o efêmero está em voga. Francis subverte a própria cronologia, mostrando que a maturidade só dilapidou o homem e o artista. Mesmo que soe paradoxal, ele busca em suas referências mais ancestrais, elementos que suprem de frescor a música que produz hoje.Talvez, por isso, o aspecto reflexivo não seja apenas uma primeira e mera impressão...Francis olha para trás mas não pára de criar, tornando mais próximas a canção existente e aquela que ainda não nasceu.

Nos extras do DVD, making-off do show e documentário gravado no estúdio da Biscoito Fino.

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